terça-feira, 30 de junho de 2009

EU SÃO PAULO

Sou apenas um – um homem só
do tamanho de um corpo
do tamanho do meu corpo
do tamanho do corpo imenso de uma cidade
sou uma cidade
correndo o tempo todo dentro de mim
o sangue correndo pelas avenidas inquietas
cada célula cada carro cada gente
mais de dez milhões de vidas correndo em mim
nunca parando nunca parando
nem mesmo dormindo eu paro
nem dormindo minha cidade para
na minha terra cinza em que não se planta nada
além de sonhos e de histórias
reconstruídos a cada enchente
minha cidade esculpida a temporais
de cada canto um grito
de cada grito um canto de andorinha
as crianças os cachorros os dejetos
o olhar de lado o olhar de frente o olhar para trás
tudo sempre cabendo no mesmo vão agora
como os que vão mais rápido que a Hora
como os que a retardam
como os que jamais saberão de onde vêm
e que aqui estão
correndo até o cansaço de calor ou frio
correndo de susto de surto ou de furto
apenas isso que é correr
para chegar ao não-limite de ser
e caber no terreno úmido das várzeas
fincar-se sem poder plantar
cada braço um logradouro
cada flor uma despedida
sendo um em mais de dez milhões que me olham
com a indiferença desconcertante do irmão
meu desejo mais terno
minha intermitente desilusão
os carros transitando entre as duas calçadas
do que escrevo
eu que também ergui as raízes do meu sonho em mim
do tamanho imensurável do meu corpo
do tamanho da minha cidade

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