terça-feira, 2 de junho de 2009

Cronossomos




O que é sentir algo que se perde? Será o mesmo que não ter tido?
O corpo que não se sente, sente que mente?
Meu corpo se constrói – assim dito, eu me construo; somos o mesmo - de mim, do tempo e da geografia.
O tempo, observador antipático e cronos, constroem meu corpo mulher, escondido de meus pares: Um desamor outro desrazão. Depois encantam e me anestesiam com jambu.
Encontramos-nus entre a estátua e a bailarina.
Ontem, na mesma hora que agora, descobri as camadas de tinta dos velhos pintores – aqueles ancestrais.
Esta é a arqueologia de como sou ou talvez cromossomos.
Nas camadas do homem e da mulher - que não sei quais são, me inventaram - fazem-se as camadas de tintas expostas ao tempo, às chuvas, aos sóis, às maresias, às ondas, ao oxigênio, aos álcalis, aos ambíguos, amigos, anfíbios.
São lascas de afresco em tom pastel que despregam da argamassa da estátua e vão fazendo descobrir o inevitável: como máscaras finas, encolho ao deixá-las ir caindo - nada ou ninguém cai de qualquer maneira. Sempre haverá uma maneira precisa de cair – e desvelando, a todo momento, alguém que não me é novo – você gostaria que fosse?
Uma cebola descascando-se, parece a mesma, mas é mesmo a mesma fractal muda, muta.
A estátua e a bailarina, frente ao espelho de si mesmas, vêem que não é apenas difícil o difícil movimento da imobilidade, mas também a imobilidade da inquietude e solidez do eterno momento do agora.
Tiradas as roupas, só a estátua não se envergonha.
Essa é nossa semelhança, arbítrio e atropelo. Não vimos a máscara neutra, nem eu, nem os outros; nem meu meio nem meus meios; meu seio, meio fio.
Vimos apenas nós – muitos - sem braços ou sem cabeças; às vezes sem eu(s), às vezes sem ela(s), às vezes cem deles.

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